Qual sua relação com a superstição?

Introdução a memórias vividas com o Botafogo em 2023.

Arthur Lemos Coutinho
6 min readAug 26, 2023
Arte criada por Lara di Mello.

A última vez que escrevi sobre o Botafogo, em dezembro de 2021, relatei algumas experiências positivas e negativas vividas nos anos de 2020 e 2021 (leia aqui).

De lá pra cá, vivemos um ano de altos e baixos em 2022, que poderia ser avaliado com uma nota 7 e estamos vivendo algo que pode se aproximar de uma nota 10 em 2023.

Neste momento escrevo sobre superstição porque o medo de voltar a escrever e ver o Botafogo perdendo o título do Brasileirão no final do campeonato é aterrorizante.

É definitivamente preferível não escrever, não fotografar, não filmar, não postar, etc., e ser vitorioso — como vem acontecendo até agora — do que “mudar o que está dando certo” e perder. Por isso, conversaremos sobre superstição, ou a falta dela.

O botafoguense, quem acompanha futebol e torcedores rivais já sabem, mas o leitor desavisado talvez não saiba que o último título nacional conquistado pelo Botafogo foi em 1995, há 28 anos. Agora, enquanto escrevo, o Botafogo lidera o Brasileirão com 48 pontos, uma vantagem de 11 pontos para o segundo colocado, o Palmeiras.

Passaram-se 20 rodadas, o Botafogo já conquistou 15 vitórias, teve 3 empates e duas derrotas. O time possui estatísticas relevantes em muitos aspectos — como menos gols sofridos e muitos gols marcados, por exemplo — tem tido um ótimo desempenho em casa, no Estádio Nilton Santos, e vem contando com a confiança da torcida para que o título de campeão se torne uma realidade após as próximas 18 rodadas que ainda restam. Afinal, se não agora, quando?

Aliás, sabe aquela história de que nem o mais otimista botafoguense imaginaria que o time faria uma campanha tão vitoriosa ?! Então, não é totalmente verdade. Um torcedor sempre decide sentar em frente a TV na expectativa de ver seu time ganhar. Sempre! Não importa as qualidades ou fraquezas da equipe, o retrospecto das últimas partidas e coisas parecidas. Independentemente da fase atual, um torcedor sempre acredita na vitória.

Então quando um campeonato longo, como é o Brasileirão por pontos corridos, está prestes a começar as expectativas aumentam mais ainda. Por outro lado, o torcedor realmente incrédulo, aquele que não acredita na vitória, deixa de acompanhar o time, desanima e não assiste mais aos jogos, imaginando que o time vai perder. Mas má fase não é sinônimo de torcida distante. Muitos torcedores continuam acompanhando o time mesmo nas fases mais tristes.

No caso do Botafogo, a primeira partida contra o São Paulo no Brasileirão 2023, em 15 de abril, também marcou a estreia do gramado sintético do Estádio Nilton Santos. O time alvinegro fez 1x0 aos 4 minutos em cabeçada de Tiquinho Soares, após cruzamento de falta cobrada por Eduardo. O tricolor empatou logo em seguida com Calleri, ainda no primeiro tempo. Mas aos 42 minutos do segundo tempo, também com uma cabeçada, dessa vez de Eduardo e com assistência de Victor Cuesta, o Botafogo garantiu a vitória na partida. Ali se iniciou uma campanha que seria surpreendente.

Nos jogos seguintes, passei a utilizar o mesmo lugar do sofá, fazer pequenos vídeos da TV enquanto os jogadores comemoravam os gols, alguns eu postava em stories e outros não, e tudo isso enquanto meu irmão Lucas e eu gritávamos e comemorávamos os gols na sala de casa. Nesse modo, assistimos — tensos, elétricos e entusiasmados — aos dois jogos seguintes.

E nesse modo supersticioso vencemos Bahia e Flamengo. A história dessas partidas merece um texto a parte.

Mas e a superstição? Eu repeti hábitos nas três primeiras partidas do campeonato e o Botafogo venceu! Logo, deveria manter o que estava dando certo. Porém, o time do Botafogo de 2023 me mostrou na quarta rodada, contra o Atlético-MG, que tudo aquilo não seria exatamente sobre mim, mas sobre eles.

Eu simplesmente não consegui sentar pra assistir o jogo contra o Galo na quarta rodada. Era domingo e estive junto com Ingrid para visitar sua avó no início da tarde, na sequência fomos fazer exercícios físicos num parque da cidade e coloquei o jogo no Premiere na tela do celular. Ouvia a narração dos gols, comemorava quando os gols saiam, mas todo aquele ritual que fiz nos jogos anteriores havia se quebrado.

Percebi, algo que já era óbvio, que não importava meu comportamento, meu poder de decisão sobre os acontecimentos era nulo. Ao não ver os jogos, quem perdia era eu.

Duas novas experiências sobre minha relação com a superstição vieram nas partidas seguintes. Na quinta rodada, enfrentamos o Corinthians. Um novo elemento esteve na sala acompanhando os jogos junto com a gente: meu cunhado Flavio. Acho que foi a primeira partida nesse campeonato que meu pai esteve vendo o jogo com a gente também. Mas meu pai é botafoguense e traria energia positiva. Flavio, o flamenguista, não.

Mas não teve jeito, metemos um 3x0 no Corinthians com energia positiva ou negativa. Flavio chegou a comentar algo como “relaxa, quero voltar aqui e ver como vocês vão estar no segundo turno”. Até aquele momento, o Botafogo já era líder do campeonato e o único time com 5 jogos e 5 vitórias.

Tudo isso mudaria na sexta rodada, quando enfrentaríamos o Goiás fora de casa. Flavio, o cunhado flamenguista, esteve novamente conosco na sala, o Botafogo até abriu o placar com gol de Tiquinho, mas sofremos a virada e perdemos o jogo por 2x1.

A invencibilidade havia acabado, mas a liderança ainda era um fato. Naquele momento cheguei a pensar que voltaríamos a uma realidade de altos e baixos, mas a campanha do Botafogo no primeiro turno se provou consistente e muito vitoriosa.

Variavelmente, voltei a manter aqueles hábitos de superstição e ganhamos a maioria das partidas. Mas na derrota para o Athletico-PR, na nona rodada, por exemplo, também repeti os hábitos e acabamos perdendo por 1x0. Pensando bem, não assisti o jogo com o Lucas na sala.

Enfim, creio que a superstição entre torcedores de futebol se refere muito mais a hábitos repetidos que tem o objetivo de tranquilizar o torcedor do que trazer boa sorte. Se criar o hábito de assistir aos jogos com determinada peça pode trazer mais confiança e tranquilidade, por que não fazer? Se assistir aos jogos no sofá de casa trará mais paz e auto controle do que assistir rodeado de outras pessoas num ambiente externo, assistir em casa pode ser melhor.

Definitivamente, me parece estranho acreditar que fatores externos são capazes de interferir tão decisivamente nos resultados dentro das quatros linhas. Isto é, seria absurdo pensar que existe algo além das ações dos jogadores no campo responsável por interferir no resultado do jogo.

Evidentemente, a exceção a esse pensamento são os casos de manipulação de resultados, como na atuação do árbitro Edilson no Campeonato Brasileiro de 2005, conhecido com o escândalo da Máfia do Apito, e nas recentes investigações de jogadores e empresários acusados de manipular apostas esportivas durante 2022. Mas nesses casos estamos falando da esfera criminal, de comportamentos nocivos que agridem diretamente o princípio do jogo.

Por fim, não me considero supersticioso. Tenho saboreado cada vitória como se fosse a primeira, tenho sonhado com o título, e tenho acreditado que neste ano seremos campeões. Dentro de campo, o time do Botafogo tem nos dado razões para acreditar.

Hoje é sábado, a rodada 21 do Brasileirão ainda vai começar. O Botafogo joga amanhã contra o Bahia, às 16h, no Nilton Santos — lugar onde temos 10 jogos e 10 vitórias. Por isso a confiança que a décima primeira vai acontecer amanhã é grande. Estarei torcendo e vibrando na sala de casa. Mas se depois que eu postar esse texto o que acontecer amanhã for algo diferente de uma vitória do Fogão, vou pensar seriamente se continuarei escrevendo.

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Arthur Lemos Coutinho

Acredita que Futebol, Política e Religião se discute. Tenta fazer isso de forma respeitosa. Doutorando-se | E-mail: arthurlemoscoutinho@gmail.com