Imprevisibilidade e o controle da TV

Questões sobre tênis, torcida e outras coisas.

Arthur Lemos Coutinho
3 min readSep 8, 2023

O cenário do tênis masculino profissional está desenhado e previsível. De um lado, um jovem talentoso e carismático desponta como favorito a ganhar toda e qualquer partida que disputar. Enquanto de outro um jogador experiente e vitorioso (e menos carismático) também aparece como forte candidato a se isolar ainda mais como maior vencedor de Grand Slams do tênis masculino.

Se há alguma imprevisibilidade, é sobre qual dos dois vai ganhar o US Open 2023 no próximo domingo. E como vai ganhar.

Obviamente, análises apressadas e rasas como a descrita acima tem tempo de validade. Por que? Porque o papel de jovem talentoso que hoje é exercido por Carlos Alcaraz já foi exercido por um outro espanhol, por um suíço, por um sérvio, por americanos e por aí vai. As rivalidades que acostumamos a ver no tênis se iniciaram, perduram e acabaram. Novas rivalidades vão surgindo, mas não sabemos durante quanto tempo as veremos.

Quantos Alcaraz x Djokovic ainda vamos ver? Rafael Nadal voltará minimamente saudável em 2024 para participar dessa brincadeira? Depois que Djokovic e Nadal se retirarem definitivamente das quadras, Jannik Sinner, Holger Rune, Daniil Medvedev serão rivais a altura de Alcaraz? Zverev, Tsitsipas, Ruud, Rublev, Fritz, Tiafoe, Auger-Aliassime e Shelton alcançarão uma prateleira superior? Alcaraz terá vigor físico suficiente para continuar sendo dominante por muito mais tempo como é agora com seus 20 anos? Só o tempo irá dizer.

No presente, é coerente dizer que previsível é aquilo que a gente imagina que tem muitas chances de acontecer. É Novak Djokovic vencendo Ben Shelton. É Carlos Alcaraz vencendo Daniil Medvedev. Mas ninguém acreditaria que o Botafogo estaria liderando o Brasileirão 2023 e aqui estamos nós. Mais pertos de um título brasileiro do Fogão do que do Flamengo, por exemplo.

Enfim, previsível é a cena que poderá ser vista em muitas casas mais tarde: dois adultos, uma televisão e um controle. Uma pessoa querendo assistir partidas de tênis agendadas pra 16h e 20h de uma sexta-feira pós-feriado. E outra pessoa com zero vontade disso.

Mas antes de confirmar o ingresso ou o lugar no sofá pra acompanhar o evento épico que será a final de domingo entre Alcaraz x Djokovic, existem duas partidas que precisam ser disputadas nas semifinais de hoje. O jovem espanhol, Alcaraz, enfrenta o russo Daniil Medvedev. E mais cedo, o cascudo Djokovic enfrenta o jovem americano Ben Shelton.

Por aqui, torcerei pelas vitórias de Shelton e Medvedev. Minha simpatia e torcida pelos dois é maior do que aquilo que vejo em Alcaraz e Djokovic. É impossível não se render ao espetáculo que os dois proporcionam atualmente. Quem viu as últimas partidas entre eles vai concordar. Desde a final de Roland Garros, com vitória de Djoko, passando pela final de Wimbledon, com vitória de Alcaraz, até a partida mais recente, em Cincinnati, vencida novamente pelo sérvio.

Uma vitória de Shelton e Medvedev hoje não seriam imprevisíveis. Pouca gente acha que vai acontecer, mas a ideia de previsível e imprevisível não cabe aqui. Imprevisível é outra coisa. Imprevisível é um torcedor colar os pés no cimento da arquibancada do estádio Arthur Ashe enquanto acontecia uma semifinal de US Open entre Coco Gauf e Karolina Muchova. Tudo isso para protestar contra o uso de combustíveis fósseis.

Saindo da arquibancada e entrando em quadra, o desejo de chegar na final é o que os semifinalistas de hoje têm em comum. A diferença é que enquanto Shelton é o estreante até em semifinais, Djokovic já chegou na final 9 vezes (perdeu 6 e venceu 3), Medvedev chegou em duas (perdeu uma e venceu outra) e Alcaraz só chegou uma vez e já conquistou o título.

Acontece que a potência dos golpes e o sorriso no rosto do jovem Shelton me representa mais do que a frieza de Djokovic. A forma meio desengonçada e eficiente de Medvedev bater na bola e se movimentar em quadra me representa mais do que o talento puro e lapidado de Alcaraz. Então, torcerei. Mas como eu não sou bobo nem nada, vou guardar minhas energias pra brigar com Ingrid pelo controle da TV para ver a final de domingo.

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Arthur Lemos Coutinho

Acredita que Futebol, Política e Religião se discute. Tenta fazer isso de forma respeitosa. Doutorando-se | E-mail: arthurlemoscoutinho@gmail.com